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Os casos da cidade de Viana do Castelo, concelhos de Caminha e de V. N. de Cerveira

1- INTRODUÇÃO

1918 foi o ano em que deflagrou a maior pandemia do século XX e que, em Portugal, dadas as condições existentes, completou a Trilogia da Miséria: Guerra, Fome e Peste (1). Conhecida como gripe espanhola (2), pneumónica ou influenza, a sua origem não é consensual. Poderá ter vindo da Ásia. Trabalhadores na América poderão ter recebido o vírus através de aves migratórias, já em janeiro desse ano. Dois meses depois, nos aquartelamentos militares no Campo Funston, Kansas, já a transmissão gripal grassava entre os soldados. No mês seguinte, contingentes americanos desembarcavam em Brest, França, disseminando a gripe entre tropas de várias nacionalidades (Barry, 2004).

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Consequentemente, a intensa e característica mobilidade dos soldados acabou por exportar a gripe para os países limítrofes e, daí, para todo o mundo, auxiliada pelos novos meios de transporte.

recorte jornal

A primeira vaga atingiu Portugal entre os meses de maio e de junho, provocando alarme e mortes na zona fronteiriça alentejana. Conforme tinha alertado Ricardo Jorge, Inspetor-Geral de Saúde, já soprava de Espanha a ameaça dum flagelo, o mais contagiante de todos, a querer repetir a ruidosa intrusão de há trinta anos [gripe russa de 1889-1890] (Jorge, 1918:3-4). Os primeiros casos de infeção foram reportados em maio, em Vila Viçosa, alastrando-se a outras praças fronteiriças e alcançando Porto e Lisboa em finais de junho.

Esta primeira onda foi débil. Como descreveu Ricardo Jorge, num quadro singelo, extinto muitas vezes ao cabo de três dias. No entanto, advertiu que agora, dificilmente, segundo os seus hábitos, deixará de haver canto que escape às presas do infecionamento. De facto, a segunda vaga gripal, que cavalgou o país de lés-a-lés, com uma virulência e morbilidade jamais vistas, entre os três a quatro meses finais de 1918, ceifou a vida em Portugal a 60 474 indivíduos (Frada, 2009). Outros estudos sugerem que alcançou 102 750 mil (Ferreira, 1979: 406-408) ou, ainda 135 257 vítimas (Bandeira, 2009:138). Estudos recentes estimam agora o volume de falecidos em 117 764 mortes (Nunes et ali, 2018). Estranhamente, a pandemia da pneumónica, à exceção de raros estudos, foi praticamente esquecida e votada ao silêncio.

Estima-se que esta segunda vaga gripe provocou entre 50 a 100 milhões de vítimas em todo o mundo (Johnson & Mueller, 2002:115). A terceira vaga, na primavera de 1919, apresentou contornos mais suaves, havendo regiões onde nem foi sentida. De qualquer forma, é consensual entre os historiadores a consideração de Portugal ter sido um dos países mais atingidos na Europa (Abreu & Serrão, 2018: 14).Captura de ecrã 2021-02-18, às 10.46.57
A dificuldade em quantificar com rigor o número de vítimas de pandemia prende-se com vários fatores: velocidade da expansão da morbus, elevado número de mortes no domicílio, incapacidade de reação das unidades assistenciais existentes, desconhecimento da especificidade da doença e seu tratamento, falta de pessoal medico e de toda a ordem de medicamentos e desinfetantes, número elevado de óbitos classificados como doenças ignoradas ou mal definidas, entre outros. Muitos especialistas referem que os números associados a este grupo deveriam ser incluídos nos cálculos finais, dado que foram óbitos catalogados numa fase incipiente do contágio, quando este apanhou instituições e população desprevenidas.

À época, as autoridades sanitárias de cada concelho deviam elaborar os dados para integrar no mapa anual Estatística do Movimento Fisiológico da População de Portugal, onde constavam, p.e., as causas de morte e patologias respetivas por concelho e distrito. Dos três concelhos analisados nesse ano pandémico, o concelho de Viana do Castelo apresentou 66,1% de óbitos com doenças ignoradas/mal definidas/outras, o de Cerveira 59,1% e o de Caminha 11,8% (3), o que é revelador do estado da assistência e condições de saúde em Portugal, mas também do desconhecimento inicial da doença e vírus associado.

Nota: Pode ler a primeira parte completa deste trabalho da autoria de Aurora Rego, na edição impressa do Jornal C já nas bancas.

 

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