O presidente da Câmara de Viana do Castelo classificou hoje de positivo o processo de transferência de competências da administração central para os municípios de Portugal continental, mas admitiu a necessidade de ajustes devido ao “centralismo cristalizado” do país.
“Na minha perspetiva, o processo é positivo, com necessidade de reajustes (…) Não se implementa um processo de descentralização com esta complexidade com um centralismo cristalizado como está o do nosso país de um momento para o outro”, afirmou hoje Luís Nobre.
Questionado pela agência Lusa sobre o alerta, esta semana, do Tribunal de Contas (TdC) para a existência de “muitas fragilidades” na transferência de competências, inclusive a falta de “mecanismos estáveis e transparentes de financiamento”, o autarca socialista disse tratar-se de “um processo gradual que tem de evoluir, com necessidade de reajustamentos, mas que tinha de ser iniciado”.
“Tudo o que é novo implica dificuldades na sua implementação, e nós temos percorrido esse processo de descentralização na educação, com correções e melhorias, com ganhos efetivos de proximidade que hoje são reconhecidos”, sustentou.
Para Luís Nobre, a atuação do Governo tem sido positiva ao promover “um diálogo consistente com cada município, e por áreas”.
“Havia divergências na área educação e cuidaram, havia na área social, cuidaram, na área saúde e estão a cuidar. Ao alargar temporalmente e ao tentar ultrapassar todas as dificuldades que têm emergido, naturalmente arrasta-se o processo. Não é positivo. O ideal era ter-se cumprido o calendário que estava inicialmente previsto, mas o que interessa é fazer bem. Acho que é o que está a ser procurado”, sublinhou.
Apontou como exemplo a área da educação, referindo que “os municípios garantiram a requalificação de 450 escolas”.
“Fizeram essa reivindicação, o Governo foi sensível, estudou o modelo de financiamento e conseguiu. Por essa via, em Viana do Castelo garantimos financiamento para intervenções nas escolas da Abelheira, Pedro Barbosa, Lanheses, Castelo de Neiva”, observou.
Além da educação, referiu o percurso na transferência de competências na área social.
“Estamos num processo de aprendizagem, mas do que fizemos até ao momento há ganhos para a qualidade do serviço e as respostas que são dadas a quem necessita. Não passamos pelo processo de descentralização na área da saúde, mas avançamos. Estamos a concluir a construção da Unidade de Saúde Familiar (USF) da Meadela, recebemos as propostas do procedimento concursal do centro de saúde de Alvarães. Não temos descentralização, mas sentimos que os municípios, pela sua proximidade, podem fazer muito”, adiantou.
“A implementação do processo foi afetada pela [pandemia] covid-19, que monopolizou atenções e recursos da administração central e dos municípios, mas outras dificuldades resultaram de insuficiências na fundamentação e planeamento”, indicou o TdC, num relatório sobre a transferência de competências para os municípios, com base em dados de janeiro de 2019 a setembro de 2022.
Segundo o relatório da instituição que fiscaliza a legalidade e regularidade das receitas e das despesas públicas em Portugal, “não se encontra evidência da existência de estudos atualizados que permitissem identificar os domínios a descentralizar”, bem como a estimativa dos ganhos de eficiência e os critérios de apuramento dos montantes a integrar no Fundo de Financiamento da Descentralização (FFD).
O processo de transferência de competências da administração central para os 278 municípios de Portugal continental começou no final da década de 1990, tendo-se iniciado um novo ciclo em 2018, com a lei n.º 50/2018, em que “são elencados 23 domínios de competências a transferir”, com áreas de grande dimensão estratégica e financeira, como educação, saúde e ação social, mas também áreas mais específicas em que a gestão pode ser potenciada localmente, como as praias, a habitação e as áreas portuárias, referiu o TdC.
O processo de transferência estava previsto decorrer de forma gradual entre janeiro de 2019 e janeiro de 2021, mas os prazos “foram largamente ultrapassados”, designadamente na educação e saúde foram prorrogados até março de 2022.
Contudo, a transferência nessas duas áreas só avançou com a celebração de acordos com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), em julho de 2022, e na ação social foi adiado até abril de 2023.
Lusa