Creio assim, que não se trata de olharmos para o papel de Caminha no Caminho, mas sim para o papel que o Caminho pode ter em Caminha.
No passado mês de novembro de 2024, tive a grande felicidade de defender a minha dissertação de mestrado, intitulada “O Caminho Português de Santiago – Caminho da Costa: A satisfação com a comunicação e promoção realizada pelos municípios e com os serviços turísticos disponibilizados.”, para a qual consegui recolher mais de 300 respostas e que pode ser lida em IC-Online: O Caminho Português de Santiago – Caminho da Costa: A satisfação com a comunicação e promoção realizada pelos municípios e com os serviços turísticos disponibilizados.
Entre as questões e comentários realizados pelo júri, uma pergunta em particular destacou-se para mim, nomeadamente, “Porquê escolher o terceiro percurso mais realizado e não o primeiro?”.
Caso o leitor seja um peregrino ou, pelo menos, um curioso e interessado pela temática da peregrinação dos Caminhos de Santiago, saberá que desde a sua certificação, o Caminho Português da Costa é o percurso com maior crescimento anual de peregrinos, estando perspetivado que esta “velha nova rota” venha, mais cedo ou mais tarde, a ultrapassar aquelas que são duas rotas históricas, o Caminho Francês e o Caminho Central Português.
A verdade é que a travessia em Caminha, entrando em Espanha por A Guarda, não é aceite de forma consensual, uma vez que, muitos estudiosos do Caminho, afirmam que no passado, nunca foi possível realizar a travessia do Rio Minho nesse local, afirmando que a travessia ocorria do município de Valença para Tui.
Contudo, seja pela beleza da paisagem – nem sempre visível pelo surpreendente nevoeiro – ou pelo espírito de aventura que a travessia de barco acrescenta à experiência, já única, de realizar o Caminho, a realidade desmente a história.
Não é preciso muito mais do que uma manhã entre os meses de maio e setembro, na esplanada do hotel Molino em Camposancos ou no cais de Caminha, de onde há anos saía o saudoso ferryboat, para verificarmos a popularidade que este ponto de passagem tem para os peregrinos do Caminho Português da Costa.
Posto isto, podemos questionar-nos de que forma esse crescimento tem impacto no município de Caminha, aquele que é o primeiro ponto possível de travessia para o território espanhol.
No ano de 2023, segundo a Oficina del Peregrino, 52 753 realizaram o Caminho Português da Costa e desses 1 146 iniciaram a sua peregrinação em Caminha, estimando-se, que tenham passado pelo município de Caminha, todos aqueles que iniciaram o Caminho da Costa em Portugal, sensivelmente 22 500 peregrinos.
Por sua vez em 2024, um total de 74 758 peregrinos percorreram a rota costeira, com 1 450 a iniciarem a peregrinação em Caminha e aproximadamente 27 500 a passarem pelo município.
A verdade é que, com base nos dados disponibilizados pela Oficina del Peregrino, no mínimo 80% dos peregrinos que iniciam a sua peregrinação em território português passam por Caminha, onde fazem depois a sua travessia para Espanha, ou prosseguem para Vila Nova de Cerveira ou Valença para aí entrarem em território espanhol.
Sabendo, portanto, que por ano passam por Caminha em média 30 000 peregrinos, e que menos de 1/3 pernoitam no concelho, como pode o município fazê-los ficar mais do que uma noite e dar a conhecer e apresentar o que este tem de melhor?
Destaco, as três principais atividades às quais os peregrinos se mostraram recetivos, ao longo do estudo que levei a cabo, designadamente, experiências gastronómicas com produtos locais, serviços de bem-estar e relaxamento e atividades culturais.
Se considerarmos, portanto, estas e outras atividades similares, os milhares de peregrinos que passam pelo município todos os anos e a sua localização estratégica e próxima de Espanha, Caminha poderá afirmar-se como um destino de referência na peregrinação e turismo religioso, tornando-se mais do que um ponto de passagem.
Creio assim, que não se trata de olharmos para o papel de Caminha no Caminho, mas sim para o papel que o Caminho pode ter em Caminha.
Igor Pacheco de Araújo
Mestre em Marketing e Promoção Turística