Desde sempre que se habituou à presença do piano porque havia um lá em casa onde a irmã, dois anos mais velha, costumava tocar. Maria João que gostava de imitar a irmã em tudo, via-a a tocar e queria fazer o mesmo.
Aos seis anos e percebendo o encanto da filha pela música e pelo piano, os pais decidiram inscrevê-la na Academia de Música Fernandes Fão. A mãe ainda tentou que fosse aprender a tocar violino mas Maria João sabia o que queria e disse que violino não era para ela e o que queria mesmo era aprender a tocar piano.
A partir daí foi conjugando a escola com a música e para além da aprendizagem normal, foi participando em diversos concursos que revelaram o seu grande talento para o piano como contou a jovem pianista numa entrevista ao Jornal C.
“Fui participando em alguns concursos e o meu professor na altura percebeu que eu até tinha jeitinho”.
Quando chegou ao 9º ano teve que tomar a decisão que lhe iria marcar o seu percurso enquanto estudante. Maria João cujo sonho era ser pianista, conta que teve que escolher entre continuar os estudos no ensino regular normal na EB 2,3/S de Caminha, com o piano na Academia, ou optar por uma formação mais especifica na área da música. Depois de ponderaras as opções, decidiu que o melhor seria ir estudar para Viana do Castelo, onde ingressou na Escola Profissional de Música do Alto Minho (ARTEAM) para completar o 12º ano.
Terminado o ensino secundário, o que aconteceu há dois anos, a aluna de piano viu-se uma vez mais obrigada a fazer escolhas, desta vez mais sérias. Depois de concorrer a várias universidades quer em Portugal quer no estrangeiro e com média para entrar em qualquer uma delas, Maria João acabou por optar pela Alemanha, país onde considera estarem os melhores professores.
E foi precisamente pelo mestre que a Maria João decidiu rumar até à Alemanha. Sabia com quem queria aprender e por isso não pensou duas vezes, como contou ao Jornal C a jovem.
“Na música as coisas funcionam um pouco de forma diferente. Nós temos que seguir o professor, é um estudo muito de mestre e aprendiz. Estamos a falar de um curso que ao contrário de outros, acaba por ser muito individual, ou seja centra-se muito no professor do instrumento que o aluno vai aprender. Por isso tive que escolher um professor que fosse mesmo adequado e com o qual eu pudesse aprender”.
Depois de ter tido aulas com vários professores, da Bélgica, Dinamarca e Portugal, quando conheceu o seu professor, o alemão Heribet Koch, Maria João não teve dúvidas que era com ele que queria seguir em frente.
“Quando conheci o meu professor tive uma espécie de click ao sentir com ele aquilo que não tinha sentido com os outros. E não estou a falar apenas ao nível da aprendizagem mas também da empatia. Ele é um génio e por isso acho que não podia estar em melhores mãos”, confessa.
Logo que percebeu que era por ali que queria ir, a jovem pianista de Caminha deu tudo para conseguir entrar. Aprender a falar Alemão, um imperativo para entrar na faculdade escolhida, foi o primeiro passo.
“Não posso dizer que tenha sido fácil mas com muito esforço lá consegui fazer o exame de alemão, uma das exigências da faculdade já que o ensino é todo feito em Alemão. Foi um esforço gigante mas felizmente consegui entrar”.
Apesar da distância e do frio, Maria João diz que está feliz. “Teve que ser, quando conheci este professor percebi imediatamente que tinha que estudar com ele e sinceramente acho que está a correr muito bem”.
Neste momento a maior dificuldade que Maria João ainda sente prende-se com a língua. “Se eu dominasse melhor a língua, acredito que a minha prestação poderia ser ainda muito melhor”, admite.
A dois anos de concluir os estudos, Maria João tem participado em diversos concursos e recitais, algo que considera muito importante para a sua preparação. ”É importante porque durante meses a fio nós estudamos as peças exaustivamente para as podermos apresentar da melhor forma possível e estes concursos e recitais permitem-nos avaliar e perceber o nível dos outros pianistas”.
E foi precisamente numa dessas participações que aconteceu no passado mês de novembro na Bélgica, que Maria João se distinguiu ao ser laureada com o prestigiado prémio de melhor interpretação de um compositor belga.
Este reconhecimento foi conquistado na competição promovida pela EPTA Belga, no âmbito dos encontros Internacionais de jovens Pianistas, que teve lugar em Grez-Doiceaux, Bélgica, entre os dias 21 e 26 de novembro. A brilhante performance da Maria João, permitiu que se destacasse entre os vários participantes, de diversas nacionalidades, notabilizando-se pela sua interpretação da peça Tendress” do compositor Joseph Jongen.
“Quando encontrei este concurso na Bélgica, perto de Bruxelas que é relativamente perto do sítio onde moro, decidi que seria interessante participar até porque o meu reportório ia muito ao encontro daquilo que eles pediam. Eles queriam uma peça Belga o que não é muito comum e eu então decidi levar uma peça muito bonita do compositor Joseph Jongen, um compositor romântico”.
Tocado com a peça escolhida pela jovem pianista portuguesa, o júri não teve dúvidas ao atribuir-lhe este prémio especial de melhor interpretação.
“Fiquei muito feliz e muito tocada porque percebi quando fui falar com um dos membros do júri, que é o mais reputado compositor belga da atualidade, que ele tinha tido a mesma interpretação que eu da peça. Eu senti como se ela representasse um regresso à minha infância, uma espécie de recordação ténue, algo minimalista que se misturava a meio com muita confusão e no final voltava a essa mesma recordação ainda mais ténue, como se fosse o princípio. Foi incrível porque ao conversar ele disse-me que tinha sentido exatamente a mesma coisa e que até tinha chorado com a minha interpretação. Acho que foi isso que o levou a dar-me distinção porque eu tenho a perfeita noção que não toquei perfeito mas toquei com emoção e isso foi muito valorizado pelo júri. Fiquei muito feliz”.
A dois anos de terminar o curso Maria João ainda não sabe o que vai fazer até porque, como a própria sublinha, “em dois anos muita coisa pode acontecer e o futuro de um músico é sempre uma coisa muito ambígua. Daqui a dois anos vê-se a trabalhar talvez na Alemanha ou na Áustria mas ainda assim garante que quer ter sempre um pé em Portugal.
“É aqui que estão as minhas raízes, é o meu país de eleição. Eu estou fora mas preciso sempre de vir cá”.
Quanto ao que quer fazer no futuro, é algo que ainda não está bem definido na sua cabeça. “Quero obviamente dar concertos mas não a tempo inteiro. Quero criar atividades, projetos ligados à música. Eu costumo dizer que um músico é um freelancer e por isso temos que ser nós a improvisar o nosso caminho”, conclui.