Com o adiamento da tomada de posse do novo Governo, provocado pela repetição das eleições no círculo da Europa, o futuro primeiro-ministro e o seu futuro Governo têm uma excelente oportunidade para fazer o que em Portugal já foi muito falado, mas nunca foi feito: Um Orçamento de Estado de Base Zero.
E mais, de mostrar a anunciada magnanimidade de diálogo com as minorias. Neste caso com o Bloco de Esquerda, que o defendia em 2012 e com a Iniciativa Liberal que o defende em 2021. Fazendo o que os une: um Orçamento de Estado de Base Zero.
Como são feitos os Orçamentos de Estado, das Autarquias e até de muitas Empresas, do lado das Despesas?
Calculam-se as despesas do ano corrente e aplicam-se taxas de crescimento, relacionadas com a inflação nos Fornecimentos e Serviços de Terceiros, o aumento de salários, o aumento do número de funcionários, etc. Adicionam-se ainda as necessidades de Investimento, Computadores, Viaturas, Telemóveis, moveis, enfim.
Com este método não se consideram efetivamente as necessidades, apenas se assume que elas crescem sempre. Quando há governos em períodos de restrições, ou as empresas estão em crise, o que se faz é cortar nesses acréscimos previstos, muitas vezes de forma cega.
Peguemos num exemplo muito simples, dos lápis. Em lugar de dizer, se o ano passado estado comprou 10 milhões de lápis e vamos ter mais 1% de funcionários, colocamos no orçamento, 10 milhões de lápis+1%= 10.010.000 lápis porque é que ninguém se pergunta, quantos lápis gastamos de facto? Ou melhor quantos lápis precisa um funcionário por ano. Mais, quantos funcionários ainda usam lápis?
O Estado não faz o que qualquer pai faz com os filhos antes das compras de material escolar. Não verifica quantos lápis o filho ainda tem antes de comprar mais uma caixa. Quando o pai faz isto, obtém duas informações preciosas que o estado despreza: Fica a saber que o filho ainda tem 5 lápis para usar e que, portanto, só gastou 5 lápis. E conclui o pai: não preciso de lhe comprar mais lápis nenhum este ano.
É isto também que fazem as empresas de sucesso, além de condicionarem as despesas orçamentadas às receitas realistas que preveem ter. O que o Estado também não faz, e por isso em 48 anos, só uma vez não teve déficit.
Fazer um Orçamento de Base Zero é exatamente começar por aqui. Por controlar o que não se gastou e atuar sobre o malfadado método de “temos que gastar o orçamento porque se não para o ano dão-nos menos para gastar”.
O que os Governos têm feito desde a Troika é cortar e cativar verbas, mas isto não resolve o problema porque são medidas cegas. Poupa na gasolina dos carros da polícia, até ao ponto de pararem de fazer patrulhas, mas não nos dos ministros que vão cada um em seu carro, para os mesmos eventos.
Tem pela frente António Costa 3 meses para fazer, pela primeira vez, um orçamento de base zero. Sem desculpas dos calendários da EU (afinal estar sem orçamento 6 meses não é problema) ou das surpresas e as adjudicações apressadas explicadas pela Pandemia.
E por uma vez, desde os lápis ao catering dos jantares de gala, orçamentar e gastar segundo as necessidades efetivas e não segundo o histórico do que se gastou, onde cabe todo o desperdício.
Para quem quiser aprofundar o tema, sugiro o documento do Tribunal de Contas publicado hoje: https://www.tcontas.pt/pt-pt/MenuSecundario/Noticias/Pages/n20220218-1.aspx
Assim mesmo, o livro da Fundação Manuel dos Santos que também acaba de sair:
https://www.ffms.pt/publicacoes/detalhe/6031/economia-portuguesa-as-ultimas-decadas