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José Porto, um nome esquecido do Modernismo Português do início do século XX

140 Anos após o seu nascimento (1883 / 2023)

O enquadramento histórico da arquitetura portuguesa do início do século XX, mantém oculto diversos nomes que contribuíram certamente para o surgimento e implementação de um novo modernismo, influenciado pela vanguarda europeia, nomeadamente o funcionalismo parisiense.

Num momento anterior, o modernismo que se encontrava enraizado vivia de uma linguagem de alguma forma menos decorada mas representativa de um conjunto de estruturas e adornos influenciados por um classicismo que ainda sobrevivia nos traços dos importantes arquitetos da época, como José Marques das Silva, autor da Estação de São Bento no Porto, ou Miguel Ventura Terra, celebre arquiteto Caminhense, autor do Santuário de Santa Luzia em Viana do Castelo, e diversas vezes galardoado com o Prémio Valmor em Lisboa.

Surgiram então, a forçar o momento de viragem, um conjunto de arquitetos que faziam refletir nos seus desenhos uma diversidade de novas características em Portugal. É o caso do arquiteto José Luiz Porto, nascido no ano de 1883 em Vilar de Mouros, e que desenvolveu, em 35 anos de atividade profissional, uma importante produção em diversas escalas e programas, destinada a clientes particulares e a entidades de inegável importância.

Comprovando ser um arquiteto de relevância, pode remeter-se a comentários de distintos arquitetos e estudiosos como Sérgio Fernández ou Nuno Portas. Este último, já nos anos 70, fazia ressaltar as qualidades espaciais das obras de José Porto, referindo-se concretamente à Casa da Vilarinha, projetada por José Porto nos anos 1939/40 para o célebre cineasta, Manoel de Oliveira. Esta é uma obra com um grande e nobre percurso de vida, que recebeu as mãos de diversos arquitetos durante a sua vida, como Alfredo Viana de Lima que apoia o projeto dos interiores, Cassiano Branco que projeta os espaços exteriores, Gonçalo Ribeiro Telles que projeta mais tarde os seus jardins ou Souto Moura que projeta os campos de jogos, piscina e ginásio. É, desde 2015, uma obra classificada como Monumento de Interesse Público. (Portaria n.º 120/2015).

No seu percurso, José Porto passa por Lisboa e Genebra onde estuda e se forma, acabando por residir em Paris entre os anos 1921 e 1933, onde teve a oportunidade de acompanhar o surgimento dos novos movimentos modernistas que explodiram nessa cidade nos loucos anos 20 e acabariam por se propagar a nível europeu. São notórias as referências dessas linguagens nos projetos do arquiteto José Porto, remetendo influências de alguns dos históricos arquitetos fundadores do modernismo da época e reconhecidos a nível mundial.

Regressa definitivamente a Portugal no ano de 1933, onde se fixa profissionalmente na cidade do Porto, desenvolvendo projetos de extrema relevância em diversas escalas, da moradia aos prédios de rendimento, e até concursos à escala urbana. Faz também uma incursão profissional à cidade da Beira em Moçambique, entre os anos de 1940 a 1949, regressando a partir daí à sua terra natal, Vilar de Mouros. Nesta altura, já com a idade de 66 anos, José Porto dedica-se à produção de projetos de cariz mais local, muitos deles de pequena dimensão, mas também projetos de dimensão urbana, como o Anteplano da Vila de Caminha.

Casa Ananias
Registo fotográfico da Casa Ananias em Caminha, no seu estado atual, em que revela ter sofrido modificações com o passar dos tempos, nomeadamente as ampliações para os originais terraços ao nível do 1º piso.

O vanguardismo e as influências parisienses que José Porto importa de Paris, refletem-se de imediato nas suas primeiras obras, como a Casa Ananias Torres em Caminha, cujo projeto data de Dezembro de 1934. Esta obra revela um conjunto de volumes depurados e desencontrados que promovem uma antecâmara exterior de entrada, terraços visitáveis, a vontade de uma cobertura plana, ainda que limitada tecnicamente na altura, e o recurso aos pilares aparentes em betão armado. Todas elas características que demonstram um alinhamento aos pontos de uma nova arquitetura modernista parisiense.

De referir também que esta foi uma das primeiras obras, em Portugal, a ser construída com recurso à estrutura porticada em betão armado (sapatas, pilares, vigas e lajes). O célebre sistema “Dominó” desenvolvido entre 1914 e 1917 pelo arquiteto Le Corbusier, e aplicado nas suas obras a partir do início da década de 20 na cidade de Paris e periferia. O vulgar sistema de construção utilizado até aos dias de hoje nas nossas habitações.

Aqui, José Porto, dá os seus primeiros passos a projetar arquitetura modernista em Portugal, confirmando notoriamente o seu vanguardismo face ao momento, de alguma forma, retrógrado que por cá se fazia sentir.

Foi um arquiteto, provavelmente como tantos outros, que viu o seu trajeto e obra afastado da história do modernismo português, merecendo estudo e divulgação, honrando o seu legado na história e refletindo o seu nome na bibliografia da especialidade.

Tentaremos com esta rubrica, justamente no ano do 140º aniversário do seu nascimento, dar um contributo nesse caminho, revelando e fazendo reavivar a obra deste arquiteto caminhense, que trouxe garantidamente gestos de modernidade a uma arquitetura nacional que se encontrava no início de um momento de viragem.



Sobre o autor

Paulo Vila Verde é um arquiteto e urbanista formado pela Escola Superior Gallaecia. O seu gosto por alguns momentos da história da arquitetura portuguesa levou-o a desenvolver e defender a sua tese de mestrado científico no Departamento de Arquitetura Gallaecia da Universidade Portucalense, abordado o início do modernismo internacional em Portugal, onde procurou investigar a vida e obra do arquiteto Vilar Mourense José Porto. Tentou com esse trabalho reforçar a atitude da sua linguagem e a necessidade de o recordar, introduzindo-o nos meandros da história da arquitetura, mais concretamente ao norte de Portugal.

A paixão pela investigação e a procura em contribuir para o conhecimento, leva-o a continuar o processo, principalmente balizado no período da primeira metade do século XX, onde acredita existir uma diversidade qualitativa e quantitativa de preciosismos que podem trazer valias para o conteúdo da arquitetura aos dias de hoje, integrando-os de forma modernizada, com o intuito de uma melhor humanização dos espaços e momentos, sejam eles interiores ou exteriores.

Esta vertente histórica e científica permitiu a publicação de alguns artigos referentes ao tema do modernismo em Portugal, onde tenta refletir sobre esses momentos e aproveitando, em simultâneo, a divulgação ao público em geral.

Foi recentemente convidado pela revista de arquitetura Anteprojetos a desenvolver uma conferência na Exponor, onde se fará acompanhar de arquitetos e professores de arquitetura e urbanismo, pretendendo abordar o importante, mas muitas vezes remetido para segundo plano, papel do paisagismo no ato de projetar arquitetura, seja na simples habitação ou à escala do espaço urbano.

Para além do prazer na investigação, leitura e escrita, é fundador do atelier “Inquietude Arquitetura”, projetado a nível nacional, mas orgulhosamente sediado em Ponte de Lima. Os projetos do atelier encontram-se implantados um pouco por todo o país, de Vila Nova de Cerveira a Albufeira, permitindo um estudo e investigação dos diferentes meios e culturas arquitetónicas locais.

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