“A história da humanidade é a história da luta de classes.”
Karl Marx
Os resultados das eleições legislativas de 18 de Maio de 2025, ficarão na história porque, pela primeira vez depois do 25 de Abril, os partidos ditos de esquerda não têm qualquer possibilidade de fazer ou de se opor, a uma mudança na constituição.
Este resultado, é a confirmação do divórcio anunciado, do casamento de conveniência e aparência que, PS e PSD mantinham pelo facto de só os 2 juntos poderem mudar a constituição. Agora, um já não precisa do outro.
Como chegou o povo sábio e soberano – sempre e não apenas quando gostamos dos resultados do seu voto – a esta manifestação da vontade popular?
Os resultados destas eleições, acentuando a tendência já demonstrada nas realizadas há pouco mais de 1 ano são, quanto a nós, fruto de uma sopa da Pedra que as pseudo elites políticas, jornalísticas, universitárias, intelectuais e afins foram cozinhando nos últimos 50 anos.
CLIVAGEM GERACIONAL
A clivagem geracional é um dos ingredientes desta sopa da Pedra. As elites dirigentes, descolaram completamente da realidade dos mais de 1,7 milhões de cidadãos que tem menos de 35 anos e votam desde a crise financeira de 2008. 1/3 desses jovens são ou já foram, Emigrantes.
A grande maioria destes jovens tem empregos precários, mal remunerados, vivem em casa dos pais ou quartos alugados. Centenas de milhar são licenciados, dezenas de milhares tem mestrados, milhares e milhares são doutorados. Apesar disso têm um futuro muito mais incerto do que os seus pais ou avós tiveram.
Este cenário, dá aos cidadãos portugueses com menos de 35 anos um sentimento de desilusão e revolta, pelo que os governantes eleitos pelos seus pais e avós foram fazendo deste país. Muito da Constituição ficou por cumprir.
A NOVA LUTA DE CLASSES
A essa clivagem, junta-se na sopa, a nova Luta de Classes. A velha luta de classes, entre a burguesia detentora do capital e dos meios de produção e o proletariado apenas detentor da sua força de trabalho, é hoje a luta entre os beneficiários, protegidos, instalados, conservadores; e os pagadores, inseguros, precários, revoltados.
Esta nova Luta de Classes, mostra nas ruas a sua pior face. Só se manifesta quem não tem que estar a trabalhar por turnos, só faz greve quem é funcionário do estado ou das empresas públicas. Resta aos pagadores revoltados manifestarem-se nas urnas de voto.
CLIVAGEM GEOGRÁFICA E TERRITORIAL
Para que a Sopa da Pedra continue a crescer, mais um dos muitos desígnios da constituição que ficou por cumprir: A Clivagem geográfica e territorial. Há 50 anos, Lisboa era Portugal e o resto era Paisagem, hoje a paisagem tem autoestradas mas essa desigualdade territorial manifesta-se em muito mais vertentes do que há 50 anos.
Hoje a Clivagem entre o interior e o litoral, entre as capitais e as aldeias, não é apenas económica, cultural, social ou nos serviços de saúde, ou na educação. Essa clivagem hoje é humana, antropológica.
E a distancia não é Geográfica, os residentes dos bairros dormitório do concelho de Sintra estão mais distantes do estilo de vida quotidiana de Lisboa, do que os residentes no centro de Viana do Castelo. Não é por acaso que as sondagens só se aproximaram dos resultados verificados em Lisboa, Porto ou Coimbra.
CLIVAGEM INTELECTUAL E CULTURAL
A folha de Hortelã para dar aquele aroma especial à Sopa da Pedra que os eleitores portugueses serviram este domingo, é a Clivagem Intelectual e Cultural. As esquerdas renegaram e manipularam a constituição que as próprias aprovaram: “Artigo 43.º (Liberdade de aprender e ensinar) 2. O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.”
A educação em Portugal é – para a maioria da população que não acede às escolas privadas- massificada, doutrinada, formatada, indiferenciada. Abriram politécnicos como cogumelos, licenciaturas de tudo e mais alguma coisa. O resultado são os desempregados e precários mais qualificados, ainda que apenas academicamente, de sempre.
IMIGRAÇÃO
Reparem caros leitores para concluir que nesta sopa, falta a broa, a Imigração, estimada em 1,6 M de residentes. Esse fenómeno é só mais uma das vertentes de como as esquerdas que dominaram este país nos últimos 50 anos, caíram na maior esparrela da teoria de Karl Marx, já agora porque, sendo elites urbanas lhes convém, os empregados baratos e submissos.
A antiga burguesia era detentora do capital e dos meios de produção, a nova burguesia é também detentora dos créditos bancários com garantias virtuais, domina as redes de influência no acesso a fundos e programas.
Lisboa, Porto e Algarve lotados de restaurantes que servem iguarias a 50, 70, 100 € por comensal a que nenhum Doutorado em psicologia, a ganhar 1.100 euros líquidos por mês, pode chegar; e que na cozinha das traseiras, tem Imigrantes a descascar batatas e a ganhar o salário mínimo, e que deixam metade ao patrão para pagar o quarto.
Por todo o país, constroem-se casas para vender a 5000 € /m2, que acabam no Alojamento Local ou na lavagem de dinheiro, porque nenhum mestre em turismo da natureza pode lá chegar. Para isso os construtores dos regimes que são os 308 municípios, recorrem à mão de obra de Imigrantes que ganham o salário mínimo e que pagam 300 € por mês, por uma cama, amontoados no mínimo aos 8 num T4, cujo proprietário pode assim pagar 2000 € por mês ao Banco, daquela casa dos subúrbios que não serve para AL.
É este o Portugal Capitalista de Estado que a minha geração construiu e que a geração dos meus filhos agora quer mudar. E tem todo o direito e todo o meu apoio para o fazer, tal e como a geração dos meus pais emigrou e se revoltou nos anos 60, para culminar no 25 de Abril.
Aos beneficiários, acomodados e protegidos, que construíram este Estado Velho de 51 anos, bom proveito para esta sopa da pedra que o voto do povo, sempre soberano e sábio em Democracia, nos serviu.
Carlos Novais de Araújo
20 de Maio de 2025