A instalação de um parque eólico offshore na costa entre Viana do Castelo e Caminha, que tem sido fortemente contestada pelas associações de pescadores locais, foi o tema dominante da última Assembleia Municipal (AM) extraordinária convocada pela Coligação O Concelho em Primeiro (OCP) que se realizou no passado dia 17 de maio.

O deputado Jorge Nande da OCP disse mesmo tratar-se do assunto mais importante da reunião revelando “estranheza” perante o silêncio da Câmara de Caminha relativamente a este assunto das “taramelas que pretendem instalar aqui na nossa costa”, disse.
“É muito estranho que a Câmara Municipal nunca se tenha referido a este assunto até nós o termos abordado na última reunião da Assembleia Municipal e até a nossa vereadora Liliana Silva ter efetuado a primeira reunião com as associações de pesca do concelho, de Viana do Castelo e dos pescadores do rio Minho”.
Para o deputado da coligação de direita este assunto não diz apenas respeito à pesca, mas também à hotelaria e aos caminhenses em geral e portanto este tem que ser um assunto do Município”, sublinhou.

“Área de afetação do parque eólico deveria ser reduzida”, defendem socialistas
Relativamente a este assunto e apesar de reconhecer “a importância da descarbonização”, a bancada do partido socialista não deixou de manifestar “preocupação com a solvência da atividade económica que é a pesca, setor fundamental da economia local e com os impactos na natureza, na paisagem e no turismo” que este parque eólico vai causar.
Convicta que este não será um projeto a abandonar pelo Governo, a deputada socialista Paula Aldeia sublinhou a necessidade de “saber salvaguardar e, acima de tudo, compatibilizar os diversos interesses em causa”.
Para a bancada do PS o importante neste momento “é trabalhar no sentido de minimizar todos o impactos que este plano possa causar ao nosso território, aos nossos pescadores, profissionais e lúdicos, aos praticantes da náutica de recreio e marítimo-turísticas”, sustentou.
Mas a deputada foi mais longe e lembrou que caso este plano se concretize, “terão de estar em cima da mesa apoios financeiros sérios e credíveis para quem deles deva ter direito”.
“Para nós, a principal preocupação prende-se efetivamente com a nossa comunidade de pescadores locais. Prende-se com os impactos socioeconómicos que esta medida poderá ter. Prende-se com o receio fundado de que a pesca poderá declinar e, com ela, perdermos um dos principais factores económicos do nosso concelho”.
Dos estudos que já leram, das opiniões já colhidas, o partido socialista defende que, “a área de afetação ao largo de Caminha e Viana do Castelo deverá em nossa opinião ser reduzida. Entendemos que, poderá ser aberta a possibilidade de algum tipo de pesca na área de exclusão, bem como abertura para a lúdica e marítimo-turísticas”.
O PS chamou ainda a atenção para a importância de se ouvirem as Associações de Pescadores, “pois serão a classe afetada com a implementação destes parques eólicos”.
Finalmente a bancada do PS considera que “a utilização económica dos nossos recursos energéticos deve ser avaliada tendo em conta o impacto que vai provocar na comunidade onde será implementada”, e apelou à união de todos nesta matéria.

“Enfrentaremos tudo e todos para que este atentado não passe do papel”
Em representação da Junta de Freguesia de Vila Praia de Âncora, o secretário Luís Matias manifestou solidariedade para com os pescadores e suas famílias, “contra os interesses de alguns que queiram, com jogadas políticas de bastidores, prejudicar e acabar com a tradição e identidade dos ancorenses.
O secretário daquela Junta de freguesia lembrou ainda a luta travada na questão do lítio, sublinhando que nestas questões a união faz a força.
Segundo Luís Matias a instalação deste parque eólico na costa caminhense “vai reduzir muito a área de pesca dos pescadores do concelho que por si só já é pequena uma vez que a norte da Ínsua já são águas internacionais espanholas e a sul estende-se até Viana do Castelo”.
Relativamente à posição da Junta de Freguesia que representa, Luís Matias foi claro : “estamos contra a autorização para a instalação deste parque eólico e lutaremos e enfrentaremos tudo e todos para que este atentado não passe do papel”, disse.
Luís Matias terminou deixando a garantia que a junta tudo irá fazer para defender os pescadores e as suas famílias “desta injustiça que quem nos governa nos quer impôs a custo de interesses dúbios de alguns”, e questionou o executivo no sentido de saber qual a posição da Câmara em relação a este assunto”.
“O senhor presidente esteve a dormir um soninho”, acusa Jorge Nande
Jorge Nande da OCP começou a sua intervenção acusando o presidente da Câmara de ter andado a dormir sobre esta matéria.
“O senhor presidente da Câmara esteve a dormir um soninho e só acordou para isto quando a OCP reuniu com os pescadores em Vila Praia de Âncora há cerca de um mês. E isto é tão verdade que na última Assembleia Municipal o senhor presidente disse que não se tinha pronunciado mas que o presidente da junta de Caminha e Vilarelho o tinha feito, como se a Câmara e a junta fossem o mesmo organismo. Não são, são autarquias locais distintas”, lembrou.
Mas em relação à pronuncia da Junta de Caminha, Jorge Nande apresentou novos dados, referindo que ela não se referiu aquilo que está agora a acontecer, ou seja em relação a este parque eólico offshore, “mas sim relativamente a um projeto anterior a este que previa, segundo o contrato, única e simplesmente montar entre 25 e 53 aerogeradores e não mais de 80 como se prevê agora.
Proposta de contrato para ordenamento – Exploração de energias renováveis offshore
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E mais, a pronúncia do presidente da junta de Caminha e Vilarelho foi somente em relação às indeminizações. Não é isso que está aqui em causa, os pescadores não precisam de migalhas nem de esmolas, do que precisam é de pescar”, disse.
Em jeito de conclusão e perguntando ao presidente se já tinha acordado do soninho, Jorge Nande perguntou a Rui Lages se “vai ou não vai começar a exigir ao seu governo a realização de um estudo de impacto ambiental das taramelas que vão montar no mar de Caminha? vai tomar uma postura dura ou não? vai ou não vai proteger os pescadores do rio Minho, do mar de Caminha? e vai ou não proteger as espécies que sabemos que vão ficar em risco e as famílias que vão deixar de ter rendimentos”, questionou.

“Eólicas assim não!”, diz CDU
Celestino Ribeiro da bancada da CDU, criticou a “argumentação político-partidária” das intervenções anteriores, considerando que as mesmas “não promovem o encontro de soluções, antes conotam aqueles que em nome do movimento associativo desempenham o papel da argumentação partidária”, disse.
Já quanto ao papel da CDU nesta matéria, Celestino Ribeiro não tem dúvidas que “o PCP tem provas dadas nesta matéria, participando em consultas públicas, audições e apreciação de propostas preliminares”.
Em requerimento ao Presidente da Comissão de Agricultura e Pescas, datado de março último, pediu a Audição de diversas entidades representativas dos profissionais da pesca sobre a proposta preliminar de novas áreas de implantação para energias renováveis, iniciativa que até hoje se aguarda, mostrando como a auscultação, a audição, o diálogo que agora o Governo diz estar em curso, viaja devagar, mais lento que o processo de instalação de parques Eólicos no país”,
Para a CDU, “este foi um processo, até à data, feito de costas voltadas ao setor da pesca, de forma muito particular. Salvo outra leitura, o Governo não protege, nem acautela os seus recursos e a sua soberania. Aliás, no relatório prévio à consulta pública, publicado em dezembro de 2022, é difícil encontrar a palavra “pesca” (a primeira vez que tal acontece é na página 7 do documento e nas 41 páginas do documento a palavra pesca apenas se repete 5 vezes). Não houve um estudo sobre as eólicas já instaladas ao largo de Viana e mesmo assim avança-se para este projeto, sem mais”.
Celestino Ribeiro considera que nesta questão “ o que importa é “a defesa clara dos interesses da população e salientou a importância de aprovar uma moção “que afirmasse o nosso compromisso enquanto eleitos de colocar os interesses locais, regionais e nacionais acima de qualquer outros, dando o nosso contributo para o futuro, medido na sustentabilidade na gestão dos recursos e na garantia das atividades produtivas às gerações vindouras. Ao contrário de outros que agora se coligam e que no passado venderam a participação municipal nas eólicas, por considerarem que esta não seria uma energia de futuro, a CDU não nega a solução eólica, e mesmo offshore; no entanto, reafirmamos: EÓLICAS, ASSIM, NÃO!”, concluiu.

“Implementação de parque eólico não deve ser feita à pressa nem de forma atabalhoada”, defende Bloco de Esquerda
O Bloco de Esquerda representado na Assembleia Municipal pelo deputado Abílio Cerqueira, começou por expressar o seu “respeito e admiração” pela classe piscatória e suas famílias.
Para aquele deputado, “a pesca no concelho de Caminha constitui, no seu conjunto, a atividade económica privada que mais população emprega, dando trabalho direto e indireto a mais gente do que qualquer outra empresa industrial ou comercial situada no nosso concelho.
É, pois, uma atividade que carece de toda a proteção do Estado e nenhuma ação do mesmo Estado que vise causar o seu prejuízo, a sua diminuição ou supressão.
Não há dúvida nenhuma de que a geração elétrica através de instalações eólicas é uma grande e incontornável necessidade e deve ser implementada o quanto antes. No entanto, isso não significa que essa implementação seja feita de qualquer forma, atabalhoadamente, com a pressa de cumprir prazos do plano do dinheiro europeu”, disse.
Para o deputado bloquista “é necessário gastar esse dinheiro que vem de Bruxelas e é preciso cumprir os prazos apertados, mas essa pressa e toda essa velocidade, não tem de atropelar ninguém e, muito menos, todos os caminhenses que constituem esta tão grande atividade industrial e comercial do concelho, como é a pesca”.
“Por isso, a instalação de um parque eólico “offshore” que impeça a continuidade do uso das pesqueiras aos nossos pescadores, só pode ser por nós firmemente repudiado”, acrescentou o deputado, referindo que “é tudo uma questão de bom senso “já que, como considerou, “é possível conciliar os dois interesses em conflito, seja pela identificação das pesqueiras, salvaguardando o seu uso, seja pelo afastamento para lá das 12 milhas de forma a não acabar com a nossa pesca”, acrescentou.
Abílio Cerqueira disse estar o BE “muito preocupado com todo este processo de imposição de interesses financeiros em prejuízo da população loca” sublinhando que compete ao município de Caminha em especial, “interferir positivamente nas intenções do Governo para que seja possível conciliar os dois interesses”, disse.

“A área que ocupa este parque é uma brutalidade”, considera Presidente da Câmara
Rui Lages, presidente da Câmara de Caminha, começou por concordar com as afirmações feitas pelo deputado Celestino Ribeiro da CDU, referindo que “nós não estamos aqui numa corrida a ver quem é que chega primeiro à meta, nós temos de estar todos unidos. Não estamos aqui para ver quem sai mais nas capas dos jornais, para dar mais entrevistas. Isto não se mede ao quilo, o que está aqui em causa é algo maior do que defender personalidades”, sustentou.
Para o chefe do executivo caminhense há duas formas de entender esta situação: “a primeira é ser negacionista ou ficarmos na nossa bolha de revolta, ou então tentarmos encontrar as melhores soluções para resolver o problema”.
Rui Lages deu conta de várias reuniões realizadas com as associações de pescadores, reuniões essas que serviram, segundo informou, “para auscultar a classe porque quando nada se sabe sobre o assunto é preciso falar com quem sabe, e foi isso que fiz. Quando me perguntam se eu sou contra ou a favor das eólicas, aquilo que eu digo é que estou ao lado da minha população e dos pescadores do meu concelho”.
Mas apesar desta posição, o presidente da Câmara diz que não se pode passar a imagem de que isto não vai acontecer.
“Temos de ser realistas e frios, na minha ótica eu acho que isto vai acontecer e por isso é que temos de estar unidos e trabalhar na mitigação de impactos que este parque vai ter no nosso território, nomeadamente na pesca que vai ser brutal.
Estamos a falar de uma área brutal, um polígono que no topo norte se situa mais ou menos entre o Forte do Cão e os Caldeirões, e que se estende dessa área até à Póvoa do Varzim. E é esta brutalidade de área que está aqui em causa”, alertou.
Nas várias reuniões em que diz ter participado, Rui Lages diz que “há margem para se tentar reduzir estas áreas por forma a que as mesmas tenham o menor impacto possível.
Nestas áreas em concreto poderá haver algum tipo de pesca”.
Para o autarca caminhense é necessário agir de forma racional , coesa e equilibrada. “É nesse sentido que estou a trabalhar, em proximidade, com racionalidade, razão e seriedade no debate”, concluiu.