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Sábado, 24 Maio, 2025
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A Ucrânia, a Prisão no Colégio de Camposancos, o Volfrâmio e o Orçamento de Estado Adiado

Toda a história do mundo pode ser resumida pelo fato de que, quando as nações são fortes, nem sempre são justas, e quando elas querem ser justas, já não são assim tão fortes.”

Winston Churchill

Vivemos tranquilos na Europa há quase 80 anos e nós, os portugueses, vimos afastado o pesadelo das guerras coloniais há quase 50 anos. Muitos da minha geração já nem a tropa fizeram ou, apenas passaram uns meses entretidos em tarefas administrativas e alguns exercícios físicos.

Para as últimas gerações de portugueses as guerras foram, até há 3 semanas, notícias distantes de territórios que desconhecemos e cujo impacto nas nossa vidas, nunca foi além de afetar o preço da gasolina ou mexer com a nossa consciência quando as misérias humanas eram transmitidas em direto na TV.

As batalhas travadas na Ex-Jugoslávia foram tratadas pelos midia como assuntos internos entre fações e guerrilhas. E víamos a Rússia e Estados Unidos, intervindo apenas fora da europa, longe das nossas casas.

No entanto, os tempos que agora vivemos fazem-nos recordar a infância e que crescemos com os nossos mais velhos a contarem as histórias da guerra civil espanhola vivida na raia e de como Salazar fez o povo pagar com fome a neutralidade na segunda grande guerra.

Do areinho na bacia da foz do Minho por onde hoje circulam os carros na marginal, ouviam-se ao nascer do sol, entre 1937 e 1940 os tiros das centenas de fuzilamentos dos republicanos presos no colégio de Camposancos, convertido em prisão falangista. E, tios e avós asseguravam-nos ao serão, que chegavam a descortinar por entre a brumas da mareta do Minho, as silhuetas dos condenados e dos executores.

Na década seguinte, contavam-nos, entre as idas para as filas das senhas de racionamento e a recolha de lenha no Camarido, viam ao lusco-fusco, navios e submarinos alemães ao largo da Ínsua a receber das gamelas locais, as cargas de volfrâmio da Serra D’Arga. Afinal, a neutralidade portuguesa era apenas militar.

Hoje entram-nos pela casa adentro imagens e sons de terras tão próximas que trazem a guerra de novo a nossas casas, as atrocidades de Putin já comparadas às de Hitler mas que também o podem ser às de Estaline, menos conhecidas e mal contabilizadas, mas não menos graves.

E a Europa, ocidental, civilizada e mais ou menos unida, mas desarmada, vê-se manietada pelas dependências dos Estados Unidos e limitada às sanções económicas e à condenação política. E vamos acalmando a nossa consciência colaborando em campanhas de ajuda aos refugiados e aceitando as consequências económicas como se fosse esse o nosso contributo moral para a libertação da Ucrânia.

A verdade é que nos últimos 30 anos, derrubado o muro de Berlim, a Europa e os Estados Unidos deixaram a Rússia restabelecer-se, isso sim, desde que abrisse as suas portas para a expansão dos negócios de todas as multinacionais americanas, inglesas, espanholas, italianas ou francesas.

Enquanto se abriam MacDonald e Zara por toda Moscovo, na qual circulam os mercedes topo de gama que nem sequer chegam a Portugal, ninguém se importou se Putin e Medved trocavam de cadeiras até se perpetuarem no poder, se a Crimeia foi ocupada, a Chechénia massacrada ou a Síria arrasada; ou se a origem da fortuna do novel cidadão português Abramovich era lícita ou ilícita, agora como quando comprou o Chelsea.

A única preocupação da Nato, Estados Unidos, Reino Unido e França, foi expandir as suas fronteiras alistando mais 9 ou 10 países, instalando as suas bases e equipando as suas forças armadas com aviões, navios e armas americanos, ingleses e franceses.

Ao alistar na Nato esses países, muitos deles antes aliados de Moscovo, a fronteira militar aproximou-se assim da Bielorrússia e Ucrânia, os últimos escudos neutros entre a Rússia e a Nato. E a perspetiva da adesão da Ucrânia à EU e à NATO, criou o pretexto do qual Putin necessitava para ressuscitar o espírito imperialista Russo, dos Czares como de Estaline, da direita como da esquerda.

Agora as soluções não são fáceis e há caminhos que se tornaram irreversíveis. Putin não pode parar a invasão da Ucrânia e perder a face. A Nato não pode atacar a Rússia e ser a causadora da terceira guerra mundial, atómica, a qual ninguém ganhará.

Esta guerra só parará com o próximo General Inverno, tal como aconteceu com Napoleão e com Hitler. Mas neste caso a Rússia não é a invadida, é o invasor.

A Alemanha, Ucrânia e Polónia não podem passar um Inverno sem o gás russo que aquece as suas casas. O impacto económico que já se faz sentir na Europa, em escalada até ao Inverno, pressionará os Governos europeus para uma solução de compromisso.

Por cá, enquanto publicita a receção e apoios para os refugiados, o governo aproveita o aumento dos combustíveis para continuar a cobrar 56 cêntimos por cada euro que pagamos nos combustíveis. Com a gasolina a 2 euros, 1,12 euros são impostos.

A especulação nos preços da energia, subindo de imediato quando as cotações internacionais sobem mas, não descendo senão muito lenta e parcialmente quando aquelas descem, é apenas mais um sinal dum estado que tudo permite aos oligopólios desde que a receita fiscal continue a aumentar.

Os fundos até agora aprovados do PRR vão em 98% do montante para o próprio estado, como se antevia e, para os particulares e pequenas empresas criam-se uns vouchers para compensar os aumentos de combustíveis, cuja complexidade e funcionamento completamente digital, deixa de fora a maioria que deles precisa, analfabetos digitais.

Entretanto, a par da dependência energética, agravada pela seca e pelo encerramento precipitado de centrais a carvão, alguns vão alertando para o risco de carências alimentares eminentes, pela dependência externa que resulta de 40 anos de políticas que conduziram à desertificação do interior, à concentração na produção de monoculturas de mirtilos, morangos e framboesas, abandonando a produção de trigo no Alentejo como de milho no nosso minho. E a pecuária cada vez mais dependente de rações com preços a disparar que farão disparar os preços da carne.

Putin sentirá também a pressão interna crescente, mas precisa de tempo e não tem pressa, só fará algum acordo que inclua um novo governo “neutro” na atual Ucrânia, ou uma Ucrânia separada em duas, a Oeste independente (fronteira com Bielorrússia) e a este “neutra” ou amiga, para manter o escudo protetor e garantir à Rússia um acesso ainda mais facilitado ao mar negro. E para negociar essa posição, precisa dos alemães com frio, e de posições consolidadas em pelo menos metade da Ucrânia.

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Infografia do autor: o futuro da(s) Ucrânia(s)?

Assim, não será novidade se, após meses de guerra com milhões de refugiados, e dezenas de milhares de mortos, a Ucrânia for mais um exemplo da política internacional de régua e esquadro, com a novidade de serem desta vez a China e a Turquia a liderar as negociações.

Alemanha Federal e de Leste, Coreia do Sul e do Norte, Chipre Turco e Chipre Grego, Curdistão repartido entre o Irão, Iraque, Turquia e Síria, são apenas alguns exemplos do passado. Ou, bem mais recente, a desintegração da Jugoslávia que resultou em 8 novos países depois de anos e anos de mortes, refugiados e destruição.

Temos pela frente tempos difíceis e com elevado grau de imprevisibilidade, mas, ao contrário da segunda guerra mundial, com Churchill e De Gaulle, em Inglaterra temos o BOJO que quer fazer esquecer as festas Covid, em França um Macron que só quer ser reeleito, e depois uma entidade chamada Comissão Europeia, eleita por ninguém, a navegar ao sabor da maré e preocupada com o impacto ambiental da guerra.

Não estranha assim que estes tempos, nos façam recordar as histórias das infâncias dos nossos mais velhos. E nos deixem angustiados com o futuro para os nossos filhos.

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