Éramos vizinhos, de varandas pegadas. Gostava de o encontrar na sua varanda quando fazia bom tempo. Alto, seco, grave e suave. Lembro-me do Sr. Correia desde os tempos da sua loja da Singer (onde hoje está o bar 111).
Quando vim para Caminha e abri a Alminha, fez-me o favor de percorrer o seu recanto mágico, com vagar e verdadeira emoção. Falou-me da sua infância e de como as peças que via ali reproduziam memórias dessa mesma infância em Moledo (a primeira bicicleta, o primeiro barco, o primeiro carro).
Cada peça de madeira tinha um enredo que a tornava ainda mais “cinematográfica”. De repente eu estava no mesmo mundo da Fábrica de Chocolate ou da oficina de Gepeto, pai do Pinóquio.
Pouco antes da Pandemia fez 100 anos. Desejei então que chegasse pelo menos aos 111, que é o número da sua porta. Fizeram-lhe uma bonita homenagem e voltou-se a falar do seu incrível mundo de madeira que as suas histórias animavam animando as suas figuras de madeira com uma vida que vinha da sua voz baixa, pausada e – sei que me repito – suave.
Havia no Sr. Correia a serenidade de um século de saber (viver!). Quando ganhámos o Europeu, voltámos a encontrar-nos à varanda onde cada um tinha a sua bandeira orgulhosamente desfraldada, ambas lado a lado nos seus paus de bandeira. Festejando ao vento.
– “Bom dia Sr. Correia, que belo dia faz e que bonita que fica a sua bandeira aí, com o rio ao fundo“. Respondeu-me: – “Obrigado. Também gosto da sua bandeira . Fica bem aí!”
Há alguns dias soube pela D. Fernanda – que todos os dias ia a casa do Sr. Correia – que o Sr. Correia tinha falecido. Ficou triste a minha casa. Ficou e está triste pela perda da presença do Sr. Correia, por não nos termos visto durante o último ano, de não lhe voltarmos a dizer como admirávamos o que tinha feito na sua oficina mágica.
Hoje, pela primeira vez após o seu falecimento vi a sua filha, a quem procurei transmitir os meus sentimentos. Tinha regressado à casa do pai pela primeira vez após o seu falecimento. Regressava para colocar na varanda a bandeira do Sporting que ele tinha feito e desenhado para quando o seu Clube voltasse a ser Campeão. A bandeira do Sporting lá estava (e está), com o leão como o “leão passante” do brasão da casa de Vila Real, feito pela mão do Sr. Correia, sobre o fundo branco que a mesma mão contornou a verde. Fiquei a olhá-la, enquanto a sua filha partia comovida. Subi à minha varanda e tirei à bandeira do Sr. Correia a fotografia que se pública.
Parabéns Sr. Correia, o seu Clube foi Campeão e que bonita que fica a sua varanda com essa bandeira!
Quis colocar a minha bandeira de Portugal na varanda, para lhe dizer, quando o visse pela manhã, na sua varanda, que era a minha homenagem ao seu carácter, o mesmo carácter que explicará a vitória do seu clube. Seria demasiado teatral, colocar lá a bandeira e o Sr. Correia não gostava de espalhafato. Fica aqui então a minha homenagem ao Sr. Correia e a todos os meus amigos Sportinguistas, por aquilo que faz os homens ou os clubes grandes: o carácter!